quarta-feira, março 31, 2004

Ironia da Calçada

Desço a calçada , estou exausto,
Não sinto o corpo, a cabeça está pesada.
As suaves gotas de chuva precipitam-se lá do alto
E embatem com estrondo na minha face.
Também o céu chora, acompanha-me em triste marcha.
Oiço vozes, que se aproximam…
Acelero o passo, hoje não estou para ninguém.
Mas… Deparo-me com uma figura estranha,
Sujeito vagabundo, de longas barbas, olhos pequenos,
Face rosada, vestido com roupas que a ninguém vestiam.
Olhou-me fixamente e perguntou:
“Porque chora o céu ?”
Sem mais que lhe diga ousei responder:
“Chora comigo a ausência das estrelas, da minha estrela…”
O sujeito pareceu compreender o que lhe dissera,
Agora que penso acho que ele leu os meus pensamentos,
Sem mais retomou o seu caminho,
e como que contente com a resposta olhou-me uma vez mais e:
“Ainda bem, pensei que chorava a minha triste vida…”
Seguiu viagem sem destino aparente.
Parei por momentos e olhei o céu,
Cá dentro a ressonância de um pensamento:
“…porque choro se sei que voltarás, se sei que te amo,
…. Porque choro eu sem direito, se me comparo ao pobre que
agora desaparecera por entre as gotas de chuva que me lavam a face?”

Segui o meu caminho.
Irónico é o destino
Quando nos faz pensar…

BR

segunda-feira, março 29, 2004

Dia do Quotidiano

Aqui vou para uma viagem,
Subo a escada da monotonia
E sento-me no banco de reflexão;
Parto na camioneta do futuro,
Que velozmente vai virando,
Num ziguezague contínuo
Por entre montes e vales,
Virgens, verdes, vastos,
Que vislumbro pelo vidro...
Ai, paisagem que me devora,
E me concentra pela admirável beleza;
Fixo nos seus socalcos,
Sou surpreendido pela travagem brusca,
Bato com a cabeça, caio no mundo real,
Eis que cheguei ao vale da morte,
Para mais umas horas de sofrimento...
...a noite aproxima-se
Sigo a viagem de regresso,
Pela mesma via e veiculo;
Ainda estou vivo...
Sinto apenas uns ferimentos...
Porém, de regresso ao lar, a dor renova-se...
Esta inquietação deixou marcas,
Dormi apenas umas horas,
Que a mão pode contar...
Preparo mais um dia brutal...
Dia do quotidiano...
Embarco na camioneta do passado...

JR

domingo, março 28, 2004

Batalho-me...

Luto contra o acaso,
Contra o cruel fado que nos aparta
Sou simples guerreiro raso
E a esperança já não me enfarta.
Batalho sem fim
Contra esta dor que não passa,
De mim contra mim
Esta espada que me trespassa.
A penúria me domina
Em cada passo que dou,
Triste é a minha sina
Que por ti se apaixonou.
Vencerei sem padecer
Sem nunca duvidar,
Para um dia renascer
E aqui te poder amar…

(hoje trovo para ti…)

BR

sexta-feira, março 26, 2004

5 Sentidos

Abro a janela do meu quarto.
Ouço a música dos pardais,
Escrita em pautas invisíveis;
Vejo no horizonte um sorriso,
Acompanhado de uma brisa sedutora,
Fecho os olhos...sinto o seu odor,
É perfume de jasmim,
Que agarro com as duas mãos
E guardo no baú das recordações.
Caiem gotículas de chuva,
Provo o seu sabor,
Sabem a lágrimas de alegria,
Que as nuvens choram,
Tal como eu, no dia em que mais senti...

JR

quinta-feira, março 25, 2004

Ébrias Lágrimas

Eu tento mas não consigo
Tento passar-te ao lado,
pelo menos um pouco
um pouco sem te lembrar
sem lembrar o teu rosto,
e no teu rosto o teu olhar...
Forço a estupidez, bebo demais,
Digo que não, digo que sim,
bebo mais,
Sem norte, sem horizonte, Peço-te:
Por favor não te esqueças de mim..
Só desta vez, só mais uma vez,
Preciso de ti, já sinto o pânico
volta depressa e não me digas talvez,
Só desta vez, so mais uma vez.


BR

terça-feira, março 23, 2004

Do nada

Chegaste sem eu dar por isso,
Por entre a confusão dos dias
Ocupaste um lugar sem dono.
De mansinho, aos poucos
Tomaste conta do espaço vazio
Que encerrado guardava
E a ninguém permitia lá chegar.
E tudo mudou,
Do nada surgiu algo,
Do algo surgiu aquilo,
E daquilo surgiu isto…
Estranho vicio que não me sai do corpo,
Insaciável desejo de te ter…
Hoje fazes parte de mim,
E por mais que quisesse,
E se o quisesse, não conseguiria,
Tirar-te, amputar-te da minha vida.
É inútil, vieste para ficar.
Eu quero que fiques.
Respiro-te o mesmo oxigénio,
Banho-me na tua luz,
Quero dividir contigo o universo,
O mundo, o meu mundo, o nosso mundo…
Quero ouvir-te dize-lo uma vez mais…
E outra, e outra, e outra
tantas vezes mais…
Sim tu sabes o quê, não revelo, tu sabes,
Tu sabes…

BR

domingo, março 21, 2004

24 Horas de Sol

Fabuloso!!! A alegria contagiante de ontem mantém-se acesa no epicentro do meu nobre coração. Ainda sinto a adrenalina de um dia espacial, nas veias correm injecções de positivismo, que aflora à superfície, e a vibrante pulsação faz-me transcender.
O espelho partido reconstituiu-se, conheceu um novo eu, as lágrimas derramadas apenas me fizeram flutuar, até à perdição daquelas vinte e quatro horas.
Sinto-me, extasiado, elevado ao patamar mais alto da condição humana, em harmonia com a natureza, acolho a sua simplicidade com um sorriso e grito aos céus:"Obrigado!!!" Obrigado árvore e água pelo vosso oxigénio que sugo intuitivamente na esperança, agora concretizada, de ter um dia de prazer. Obrigado a todos os que me trouxeram felicidade e me fazem sentir vivo...

Hoje é assim, amanhã é outro dia…

…no meu mundo o sol voltou a brilhar

JR

sábado, março 20, 2004

Cai a mascara

Dou-te tanto…
Entrego-me de corpo e alma,
Deixo-me cair nas tuas mãos
Sem defesas sem sequer pensar.
Troco tudo por ti,
Troco-me a mim, troco a todos.
Nada ou ninguém me é mais importante.
E tu pareces nem ver.
Para aqui fico caído ao acaso
Vulnerável aos demónios que se acercam.

Porque me viras as costas meu anjo?
Porque me deixas assim?
Exposto a tanta tortura a tanto desalento.
Não ouço do eco a resposta.
Não te ouço…
São estas as horas em que não dá mais
Longe dos olhares, longe de todos
Não preciso mais esconder,
Deixo cair a mascara que ostento
Homem durante o dia...
Rato durante a noite…
O sorriso forçado dilui-se
Nas lágrimas secas
Que me afogam…

BR

quarta-feira, março 17, 2004

Sem nele viver

Sigo por ruas estreitas, sombrias,
Tudo parece igual a ontem
E mesmo assim não sei voltar…
Caminho só,
Palmilho a cidade sem rumo,
Sem pressa, sem vontade.

Vivo num mundo sem nele viver,
Á cabeça levo uma bilha cheia,
Cheia de sentimento puro
Do amor que me transborda.
Atravesso a multidão que dança, canta,
Celebram o arraial da vida,
Das suas vidas…
Não deixo que uma única gota transborde
A medo de te perder para sempre.
No final olho para trás,
E nada consigo descrever.
Como um cego
Atravessei a multidão que festejava
sem nela perceber...

Vivo num mundo sem nele viver…

Mesmo assim continuo,
Antes nada ver que te perder.
Rumo às cegas,
Gasto o tempo,
Alimento de lembranças
Rude amor que me devora.
Inverno que não passa,
Dor que não se acalma.
Arrasto-me moribundo pelas vielas da minha alma.

(inspirado em algo que li)


BR

segunda-feira, março 15, 2004

Utopias

Hoje penso
Em revolucionar o mundo,
Esquecer as ambiguidades,
Subtrair as invejas,
Cimentar as amizades.
Vislumbro o utópico
E como seria lindo
O mundo respirar paz.
Imagino, que o mal jaz
Sete palmos abaixo da terra,
Que a carne humana
Esteja vacinada.
Não mais dor, não mais guerra
Na sociedade insana...

JR

sábado, março 13, 2004

Aqui em baixo...

Aqui vou eu aos trambolhões.
Tropeço no vazio
enquanto me precipito em direcção ao solo.
Caio desamparado lá do alto,
De onde me deixaste, e donde não queria sair mas...
Revejo tudo durante esta viagem de sentido único.
Meses de trabalho, dias de desespero,
Tu,
O erro, o fim, o nada, fracasso, desilusão,
Montra de falhanços, que me inquieta,
Que não me deixa aceitar mais este tombo,
sem perguntar:
Porquê? Que raio fiz eu de mal?
Que é feito da minha ponta de sorte?
Dizem que atribuem um pouco a todos quando nascemos,
Será que não nasci? Será que vivo uma vida que não é minha?
Vendo a minha alma ao diabo,
Só para te ter aqui por uns momentos,
Quero ouvir da tua boca que vai ficar tudo bem.
Mesmo que não acredites.
Parece que ainda sinto as nuvens rasgarem-se por entre os dedos,
E a todos olho lá de cima.
Mas o cheiro de terra molhada apercebe-me
Que já cheguei ao fim da viagem….
Não me consigo mexer, apenas olhos o céu,
Escurece lentamente, a luz perde-se pelo canto do olho,
Alguém se aproxima
És tu meu anjo?
Estico a mão para apanhar o vulto.
Quero beber dos teus lábios a poção do rejuvenescimento
Quero voltar a voar, lá para cima,
Para lá do horizonte,
Este que agora vejo prostrado no chão,
E que não alcanço, não consigo…
Estou fraco… Sou fraco…

B R

quarta-feira, março 10, 2004

Raio de sol

Espreito por entre o murmúrio ensurdecedor,
Tento ver para lá do véu…
Agitação de vozes perdidas e
Diálogos cruzados de assuntos diferentes,
Flutuam a deriva na densa neblina
Do afónico caos…
Está quente aqui, abafado
Não consigo respirar…
Tremem-me as mãos.
Ambiente pesado, confuso,
Calem-se por favor…
Sinto a cabeça latejar,
Não sei se pelo meu estado febril,
Ou pelo esforço que faço em aqui ficar a enlouquecer.
Penso em ti por entre os escassos espaços
De silencio e calma.
Calem-se por favor…
Pela janela reparo
No raio de sol que perfura as nuvens,
Parece chamar por mim…
Cá fora o ar dissolve-se
Está mais fresco, estou mais calmo,
Por cima do ombro vejo os demónios
Que se misturam nas trevas daquele lugar…
Já te vejo, a tua imagem na minha cabeça
Recupera a sua nitidez natural…
Fecho os olhos e já vejo o teu sorriso,
Quase te consigo tocar…
Pequena lágrima insiste em deslizar
Pela colina do meu desejo,
Ter-te aqui agora…

(fuga a uma aula que teimava em não acabar…)

B R

domingo, março 07, 2004

Devaneios

Olho para o espelho,
Vejo, olhos distantes,
Pálpebras esbugalhadas,
As olheiras a cobrirem a face,
O novo corpo a envelhecer,
O reflexo de uma vida amarga.

Precipita-se a primeira lágrima,
Que procuro afastar com um disfarce
(...) visto o fato de alegria;
Nesse instante, a ampulheta petrifica,
E o espelho quebra por engano,
Farto de me ver, como as pessoas...

E tudo em meu redor
É triste, é negro, é cacos.
Voltam as lágrimas, crio um rio,
Onde me perco e me procuro,
Onde me afogo e me suicido,
Com gotas e estilhaços...

JR

sexta-feira, março 05, 2004

Aqui no Alto...

Fazes-me tão bem...
Fecho os olhos e ainda te vejo sorrir.
Há muito que não me sentia assim
extasiado, vivo, feliz...
Sinto-me capaz de parar as águas e
inverter os seus cursos, voar,
pairar sobre as nuvens,
gritar bem alto, acordar o mundo...
Num só querer
Dizer a todos o que tenho de esconder,
calar e guardar só para nós
o que quero partilhar...
Sinto o teu beijo,
A tua pele macia...

Caminho até casa enquanto te afastas,
lá no alto as coniventes estrelas
regressam agora aos seus sitios,
Deixaram-nos a sós por momentos...
Agradeci pessoalmente a todas
enquanto descia do meu voo...
Já ouço os grão de areia que caem do deserto
na ampulheta que não enche,
eternos segundos que não passam
no relógio estragado a que deste corda,
Ansioso conto cada um
enquanto desejo secretamente
te voltar a ver...
te voltar a amar...

B R


quarta-feira, março 03, 2004

O Último Grito

Depois de uma longa conversa,
Eis que choro em silêncio
Para as paredes não ouvirem;
Lágrimas escoam a grande velocidade
Queimando a tez à sua passagem,
Os arrepios encolhem-me...
Curvo-me sobre mim próprio
E permaneço imóvel.
Silêncio total...
Soluço em sussurro,
A agonia é muito grande,
Uma luz paira sobre mim,
Fecho os olhos para sempre;
Não mais lágrimas, não mais agonia,
Soltei o último grito,
Que é mudo, por sinal...

JR

terça-feira, março 02, 2004

Melodia

"Olá... Sempre vim..."
A tua voz meiga agita a calma da noite…
Chegas mais perto…
Sussurras no meu ouvido
palavras que não entendo.
Sorris, olho os teus olhos
Verdes, mágicos, inebriantes,
hoje só meus, para sempre meus…

Toco os teus lábios...
Beijo-te, beijas-me...
Pedes-me que te abrace,
Sem perguntas, sem medos.
Os nossos corpos bradam em uníssono
a melodia que há muito calámos...
Fundidos num só
Recusamos às palavras,
Deixando-as ao acaso
Por entre gestos que falam…
Fazemos amor…
Beijo-te, beijas-me…

Renasço, desperto para a tua ausência.
Ainda sinto o teu cheiro em mim,
Os meus braços ainda não largaram teu corpo…
Afastas-te…
O teu semblante dispersa-se no escuro.
Arrefece o ainda quente lugar a meu lado…
Oiço ao longe restos de uma melodia que se extingue…

Entendo agora as palavras que me disseste:
"Não acordes... Este é o nosso sonho, o nosso mundo da fantasia,
por favor não acordes..."

Sonho vão…
Inexpugnável realidade...
Morna... Fria...

B R